sexta-feira, 23 de abril de 2021

How many roads must a man walk down before you call him a man?

Olá querides, como vão? Espero sinceramente que bem. 
Falei que falaria de filmes concorrentes ao Oscar, certo? No post anterior falei sobre Os Estados Unidos vs Billie Holiday e nesse eu fiquei em dúvida se escreveria sobre O Som do Silêncio ou sobre Uma Noite em Miami. Acabei escolhendo o segundo apesar de ter gostado mais do primeiro. 
Vocês podem estar pensando : "Mas se ela gostou mais do primeiro porque vai escrever sobre o segundo?"
Porque quase todo mundo escreveu sobre o primeiro, não que ele não mereça. Merece sim pois é um ótimo filme, inclusive assistam. 
Mas acho que por ser o primeiro longa de Regina King como diretora e por ele de certa forma me lembrar um dos meus filmes preferidos resolvi escolhê-lo. 


Uma Noite em Miami é um filme de 2020 e está disponível no Amazon Prime Video.Baseado na peça de teatro de mesmo nome e escrita por Kemp Powers e foi ele mesmo quem fez o roteiro para o filme, Powers também é responsável pelo roteiro de Preciosa e Soul ( indicado ao Oscar de Melhor Longa de Animação).
O filme relata um encontro fictício numa noite de 1964 quando Cassius Clay (Eli Goree) , que posteriormente se tornará Muhammad Ali, derrota Sony Liston. 



Que o encontro aconteceu, aconteceu. Mas se ele foi como relatado no filme ninguém sabe. 
Esse encontro foi exatamente para celebrar essa vitória de Cash, é como os outros 3 amigos o chamam. E quem são esses amigos? 
Sam Cooke (Leslie Odom Jr), Malcom X ( Kingsley Ben-Adir) e Jim Brown (Aldis Hodge).


Mas antes do encontro entre eles acontecer o roteiro traz pequenos acontecimentos para nos fazer entrar no clima do que une esses quatro homens, como Cooke se apresentando num hotel de brancos e enquanto ele se apresenta esses brancos vão se levantando um a um ou Brown indo visitar um velho conhecido , branco, que o recebe na varanda da casa e faz questão a todo o tempo de deixar bem evidente onde é o lugar dele. 
Todos os atores estão muito bem, Eli Goree captou bem o olhar de Clay, como o corpo se posiciona, como se move mas é Leslie Odom Jr. quem arrasa, tanto que está concorrendo ao Oscar de melhor ator coadjuvante mas não leva. É notável que o ator se empenhou demais se pegarmos a cena da ultima apresentação de Cooke e a mesma cena interpretada por Leslie no filme até o modo como ele mexe a boca para cantar é igual. 
Bom, então acontece a luta, Clay vence e Cooke é o primeiro a chegar no hotel onde combinou de encontrar os demais. Na sequencia chegam Malcom X, Brown e Clay. Até então eles acham que srá uma festa, com bebida, mulheres, música. 
Mas Malcom tinha outros planos pra noite e eles acabam ficando ali naquele quarto de hotel onde vários assuntos são abordados, alguns mais suaves, outros mais duros, chegando até discussões mais acaloradas.


Pelo filme ficar boa parte nesse cenário me fez lembrar de Deus da Canificina (2011 - Roman Polanski) que assim como esse filme é baseado numa peça teatral. Fazer com que um filme baseado em uma peça teatral e com pouquíssimo cenário fluir não é fácil e nem pra qualquer um e Regina King conseguiu cumprir a tarefa com bastante êxito. 
Numa das cenas bastante importantes do filme Malcom questiona a Cooke qual a função da arte na luta deles e coloca para tocar "Blowin in the wind" de Bob Dylan e provoca : 'Como um branco de Minessota pode compor uma música que diz tanto a nossa luta?". Cooke engole seco e mais pra frente confessa a Brown que quando ele escutou a música pela primeira vez ele ficou muito puto e que aquilo fez com que ele começasse a trabalhar numa canção e em breve a lançaria. 
A música em questão é A Change in Gonna Come. Além da música de Dylan vários outros episódios da vida de Cooke o inspiraram a compor a canção como quando ele tentou se hospedar num hotel de brancos e foi impedido. 



Cooke não pode presenciar o lançamento da música que foi gravada em Janeiro de 1964 pela RCA  produzida por Hugo & Luigi, mas Cooke foi assassinado em Dezembro do mesmo ano e a música foi lançada meses depois.
Temos inúmeras regravações dessa música que se tornou o hino do Movimento pelos Direitos Civis. 
Entre várias versões vou destacar Otis Redding e Aretha Franklin.
A versão de Otis: 



E a versão de Aretha: 




Já cantaram Bettie LaVette e Jon Bon Jovi, Patti Labelle e Beyoncé, passando por Celine Dion e Jeniffer Hudson. 
É incrível e triste como hoje em dia ainda estarmos aguardando por essas mudanças. Mais um filme pra assistir e refletir. 
Domingo tem premiação, façam suas apostas. Se der vou fazer um post só com as minhas apostas. 
Até mais.







quinta-feira, 15 de abril de 2021

“It’s about human rights. The government forgets that sometimes.”

 No último final de semana assistimos "Estados Unidos vs Billie Holiday". Andra Day interpreta Billie e está concorrendo ao Oscar de Melhor Atriz e sim, ela está muito bem. Leva o prêmio? Sinceramente não acredito que leve mas não sabemos o que se passa nos votantes da Academia.
O filme foi lançado pela Hulu e tem direção de Lee Daniels e roteiro adaptado de Suzan - Lori Parks baseado na obra de Johann Hari ( Chasing the scream ).
Gostei do filme ? Sim mas não amei. Explico! 

Me incomodou demais o modo vazio com que a vida de Billie Holiday é tratada, reduzindo a um pedaço de carne que era viciada, tinha relacionamentos ruins e se drogava. 
E pelo amor da deusa, ela foi muito mais que isso. 
Tudo bem que o filme vem contar um episódio na vida dela mas um pouco mais de cuidado e carinho pela roteirista e pelo diretor poderia ter sido feito. E olha que Lee Daniels dirigiu um filme que gosto muito, Preciosa.
A passagem em questão foi quando Billie gravou Strange Fruit e o Governo americano passou a persegui-la por conta da música. Pra entende tudo isso é necessario contextualizar o cenário como um todo e depois seguir para a música e o porque da perseguição. 
Em 1936, o professor, poeta e compositor Abel Meeropol escreveu o poema " Strange Fruit" após o linchamento de dois homens negros e diante de tantos outros que aconteciam principalmente no Sul dos EUA.
 Abel publicou sob pseudônimo de Lewis Allan. Tempos depois ele musicou o poema e até o apresentou em alguns protestos, inclusive no Madison Square Garden. 
Foi Barney Josephson que a apresentou a Billie Holiday que a cantou pela primeira vez no Café Society em Greenwich Village. 
Depois dessa primeira vez , Billie sabia que a música tinha que fazer parte do seu repertório e é claro que o Governo discorda.



 
Billie não conseguiu gravar a música pela sua gravadora , Columbia Records, então coube a uma gravadora menor , a Commodore Records fazê-la. 
A música se popularizou, todos queriam que ela cantasse e ela queria cantar mas como houve uma perseguição sem tamanho a ela, com outros argumentos que não a música para prendê-la .
Sua mãe chegou a questionar porque ela se fazia notar daquela maneira e ela respondeu "Porque pode melhorar as coisas". 
No filme ela fala que o Governo não gosta da canção pois ela o faz lembrar de tudo que ele fez e faz aos negros. 
No ano passado, com a morte de George Floyd a música ressurgiu nos protestos e aquele bando de gente que nunca refletiu sobre isso postando "Black Lives Matter". Eu pergunto, será que importam mesmo ? 
O quanto antirracista você é? 
Entendem porque o filme nunca poderia ser resumido ao que se resumiu ?
Por aqui temos tantas atrocidades quanto lá mas aqui as vidas negras importam ainda menos, afinal de contas "A carne mais barata do mercado é a carne negra..." não é mesmo?
Segue a letra da música e o link dela:

Strange Fruit


Southern trees bear strange fruit,
Blood on the leaves and blood at the root,
Black body swinging in the Southern breeze,
Strange fruit hanging from the poplar trees.

Pastoral scene of the gallant South,
The bulging eyes and the twisted mouth,
Scent of magnolia sweet and fresh,
Then the sudden smell of burning flesh!

Here is fruit for the crows to pluck,
For the rain to gather, for the wind to suck,
For the sun to rot, for the trees to drop,
Here is a strange and bitter crop.



quarta-feira, 7 de abril de 2021

A uberização da vida


E aí? Como vão vocês?
Espero que todos estejam bem.
Faz um tempão desde a ultima vez que postei algo e tanta coisa aconteceu e agora estamos todos em quarentena...
Tantas reflexões a fazer e tudo mais e resolvi retomar o blog pra valer, mentira. Mas vou tentar postar com menos intervalos. 
No meio de tanta coisa e com tanto tempo livre assistimos um dos filmes que eu pedi pro Fernando baixar no ano passado, finalmente. 
Se alguém te perguntar "Qual diretor de cinema é seu(sua) favoritx ?", eu nunca sei o que responder por não tenho um somente. 
Por exemplo, amo como Fincher constrói seus filmes, amo a estética e diálogos do Tarantino e ultimamente ando amando muito o quão próximo da nossa realidade está Ken Loach. 
Anos atrás assisti "Eu, Daniel Blake" e eu chorei pra caramba.
Não sei se somente pela tristeza do filme ou se também de desespero pois a situação narrada pelo filme é muito real.
Ken Loach e sua equipe coloca em seu elencos atores pouco conhecidos, talvez por nós e não tão desconhecidos por lá, e que parecem pessoas do nosso cotidiano.




"Você não estava aqui" é um filme de 2019, dirigido por Ken Loach e com roteiro de Paul Laverty. Os dois tem essa parceria desde de 1996 quando Laverty escreveu o roteiro de "Uma canção para Carla".
O filme conta a história de Rick e sua família, Abbie, sua esposo que trabalha como cuidadora, Seb, o filho mais velho e a caçula Liza, eles moram em Newcastle e o ano é 2018. 
O filme começa com Ricky participando de uma entrevista de emprego e já nesse diálogo você já começa a ter uma ideia do que virá. 

A empresa em questão é uma empresa de entregas, tipo Loggi e o papo do entrevistador que depois vamos saber que é o encarregado ( é chefe mas fala diferente, sabe?) que vem com aquele papo de "Aqui você não trabalha pra gente, você trabalha conosco", Você não dirige pra gente, você presta um serviço", "Você bate o ponto, faz eu próprio horário, é senhor do seu prórpio destino". AHAM!!!!!

Bom, Ricky resolve então entrar pra esse serviço maravilhoso mas ele não tem um carro e pra trabalhar com entrega tem que ter um carro, uma van. Como não tem como financiar a van acaba convencendo Abbie a vender o carro que ela usa pra ir trabalhar pra financiar a van. 
A gente sabe exatamente onde isso vai dar, a gente vê isso todos os dias com os entregadores do iFood, Rapi, Loggi, motoristas do Uber, 99...
Vimos esse filme quando teve o primeiro "Breque dos APP" e dias depois estava eu rastreando minha encomenda que vinha pelo Loggi, Que merda,
Voltando, Ricky  trabalha como um louco e ganha pouquíssimo e começa a perceber que ele quase não vê sua família, com Seb dando trabalho na escola e cheio de rebeldia, totalmente comum a idade.
Abbie também não consegue mais chegar cedo em casa pois está sem carro e tem que usar o transporte público. 


E é obvio que eles trabalham tanto pra tentar ter uma vida melhor e dar uma vida melhor a seus filhos.
E aí se identificou com alguma coisa?
Sei que normalmente eu escolho uma música para fazer o post e depois o filme que tem essa música ou o contrário mas esse será um dos poucos posts que não terá música atrelada a ele pois não consegui identificar a única música que toca no filme e é num dos raros momentos que a família está de certa forma reunida e feliz. 
Você nao estava aqui é um dos filmes que todo mundo deveria ver ainda mais nesse "novo normal" (tenho uma raiva dessa nova expressão) e o tanto que a gente tem comprado pela internet e a nossa relação com esses serviços onde a pessoa é ~seu próprio patrão". 


Até breve, devo voltar com mais frequência e pra falar sobre os filmes do Oscar, porque sim.